Como Washington Olivetto inspirou minha trajetória na publicidade e transformou a comunicação criativa no Brasil.
O impacto de W na publicidade vai além de suas campanhas. Ele redefiniu a forma como enxergamos criatividade, erros e acertos, tornando-se uma referência tanto na cultura popular quanto na minha vida profissional.
Disclaimer:
Por motivos de força de afeto, tristeza e saudade, vou dar uma pausa nos conteúdos que tenho feito sobre minha pós-graduação em Comunicação Empresarial Transmídia na ESPM.
Nos dois últimos conteúdos postados, explorei “O que eu aprendi (até agora) sobre reputação?” e “Comunicação Estratégica Integrada: O Coração que Faz as Empresas Pulsarem”.
Mas o texto emocional a seguir tem tudo a ver com o que estou aprendendo sobre legado, reputação e como a comunicação pode tocar almas, porque W fez isso de forma brilhante.
Se eu pesquisar na minha alma publicitária "WWW, ponto…" meu Goocoração vai autocompletar: O que você deseja saber de Washington Olivetto? A resposta? Bom, daria um filme ou uma série sobre a vida, criatividade e obra de Washington Olivetto. (Streamings, fica a dica!).
Mas algo que sempre ressurge é o quanto ele influenciou, não só a publicidade no Brasil, mas também minha própria história.
O primeiro impacto eu e ninguém esquece
Meu primeiro contato com W foi no livro Na Toca dos Leões, de Fernando Morais, que conheci a famosa história do pneu furado de um Fusca, que rendeu a W seu primeiro emprego em uma agência. Esse relato acendeu em mim a ideia da “caixa de sapato.” Li sobre alguém que enviou um par de sapatos à W/Brasil, com o recado: "Cansei de gastar sola atrás de um estágio."
Desde então, sempre que quero me destacar em projetos ou recolocações, pergunto a mim mesmo: Qual será a minha "caixa de sapato" para fazer os olhos de quem me vê brilhar?
A Publicidade Que Se Tornou Memória Coletiva
O comercial "O Primeiro Sutiã A Gente Nunca Esquece" – 1987, criado por Washington Olivetto, é um marco na publicidade brasileira. Na época, sócio da W/Brasil, W fez dessa peça publicitária uma das suas primeiras campanhas a romper a barreira da propaganda para se transformar em uma expressão cultural. O conceito do "primeiro" foi tão poderoso que deixou de ser só sobre um produto, virou um símbolo de passagem e foi adotado pela cultura popular.
Com esse anúncio, as propagandas começaram a se reinventar, deixando de ser meras interrupções na vida das pessoas para se tornarem histórias que o público ansiava em ver.
E se você, jovem mancebo da propaganda, já se pegou repetindo a frase "O primeiro a gente nunca esquece...", saiba que, por osmose, você também foi impactado pela publicidade popular de W — mesmo sem tê-lo conhecido.
Em uma releitura histórica e emocionante, essa mesma peça foi refeita em 2021 para a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), trazendo uma nova perspectiva ao clássico.
O comercial revisitou a narrativa do "primeiro sutiã" sob uma ótica inclusiva e de reconhecimento à diversidade, reafirmando o impacto atemporal e a sensibilidade de W para contar histórias que marcam gerações.
A publicidade assinada com W
Assistindo às campanhas da W/Brasil, comecei a reparar na discreta assinatura no canto dos comerciais. Era sutil, quase como uma marca d’água, mas estava lá. W foi pioneiro em assinar os filmes publicitários no Brasil, algo que logo se tornou tendência.
Eu, ainda nem na faculdade, já sabia o nome de várias agências só por essas assinaturas. A ideia de autoria na publicidade me inspirou profundamente. É o toque pessoal, a assinatura que transforma um comercial em uma obra com alma.
Democracia Corinthiana: Criatividade e Cultura Popular
W foi, democraticamente, o corintiano mais criativo e publicitário roxo. Uma de suas maiores contribuições foi a campanha Democracia Corinthiana. O movimento, liderado por Sócrates, Casagrande, Wladimir e Zenon nos anos 80, foi uma revolução em plena ditadura militar, defendendo a participação coletiva nas decisões do time.
W captou esse espírito de liberdade e autodeterminação e transformou-o numa campanha que transcendeu o futebol, virando manifesto de liberdade.
Hoje, é quase trágico ver como o futebol está cada vez mais comercializado. A mercantilização dos clubes, com a “BETficação” tomando conta, roubou parte da alma que a Democracia Corinthiana defendia. Em vez de apostarmos num futebol democrático, ficamos apenas com as apostas.
O discurso lúcido no Caboré de 2019
No palco do Unimed Hall, em São Paulo, Olivetto recebeu o Caboré das mãos de Carlinhos Moreno, o icônico “Garoto Bombril.” Em seu discurso, W mostrou sua lucidez política. “O ano de 2019 começou com o país em que nasci mergulhado em um furdunço autoritário,” ele comentou, refletindo sobre o Brasil de Bolsonaro, sem citar diretamente o nome.
Foi uma crítica elegante, mostrando seu desconforto com o cenário, em que o “país da doçura” havia se tornado “o país do amargor.” Faltam posicionamentos assim no mercado publicitário, onde muitos preferem se esconder atrás de frases como “não misturo política com criação.”
“O ano de 2019 começou com o país em que nasci mergulhado em um furdunço autoritário visto pelo mundo inteiro. Então, tive que explicar o inexplicável em Londres: como a nação da doçura tinha virado o país do amargor. O ano além desses incômodos incontornáveis, me trouxe também perdas irreparáveis, como meu amigo Boechat, meu ídolo André Midani e a querida Fernanda Young. E perdi minha mãe Antonia, aos 89 anos de idade. Mas também trouxe alegrias. Meu filho Homero conseguiu realizar dois longas metragens em um país onde a palavra cultura virou palavrão” - Washington Olivetto, Caboré 2019.
Mesmo sem ser envolvido diretamente em propaganda política, W sabia se posicionar. Um bom exemplo é sua campanha para o TSE em 2008, que alertava os eleitores sobre os perigos de votar "errado."
No filme, ele comparava o erro de votar errado a viver com “o zumbido de uma abelha na cabeça por quatro anos ou mais” uma sacada genial de W.
A herança de W na minha carreira: Dose Publicitária
Foi inspirado nesse legado de W que criei, junto com meu amigo e sócio Flávio Lucio, o canal Dose Publicitária. Queremos continuar o que W começou: popularizar a publicidade, torná-la acessível e parte da cultura popular brasileira.
Depois de Washington Olivetto, a publicidade brasileira “dá de W a zero.” Nossa missão no Dose é levar a criatividade para além dos comerciais e integrar a publicidade ao dia a dia.
Aprendendo com erros: Poesia e Publicidade
W me ensinou que errar na publicidade pode não trazer prêmios, mas rende boas histórias. Como ele mesmo fez no livro Os Piores Textos de Washington Olivetto, onde transforma seus erros em aprendizado. No meu caso, sem o capital profissional e os privilégios de grandes, errar só me rendeu algumas demissões... rsrsrs. Mas a verdade é que W me inspirou a trazer a poesia para a publicidade, porque ele mostrou que sensibilidade e ousadia são o caminho.
O impacto duradouro
Quando a WMcCann postou “Se parar pra pensar, o nome de TODAS as agências deveria começar com W,” eu senti o peso dessa verdade. W não só criou a W/Brasil, ele moldou a cultura popular e a vida de milhares de publicitários.
Homenagem da W/MCcann a Wasington Olivetto |
Foi W quem me fez escolher ser publicitário, e tive a honra de dizer isso a ele pessoalmente. Em 2012, durante um evento, ele respondeu com sua sagacidade característica: “Você me desculpe!” A plateia riu, e eu também, com o coração cheio de gratidão.
A publicidade nunca mais será a mesma
Hoje, olhando para minha trajetória, sei que tudo começou com W. Se adoto a poesia na publicidade, foi porque ele me inspirou. Sua sensibilidade, sua ousadia, seu legado permanecem vivos em mim e na publicidade brasileira.
A publicidade será outra depois de W. E tem que ser. Afinal, depois de W, o mínimo que podemos fazer é continuar criando histórias memoráveis, populares, e com a alma que ele nos ensinou a ter.
Corrigindo-me: A publicidade depois de W tem que ser diferente.
Obrigado por tudo, mestre.
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